Não é de hoje que a produção de algodão agroecológico na Borborema (PB) representa a garantia de renda e comercialização justa para as famílias agricultoras da região. Ao final de março, durante o Seminário Territorial do Algodão Agroecológico, ocorrido no município de Lagoa Seca, elas comemoraram mais uma boa compra da safra pelas empresas VEJA e Anormal. Os contratos de compra foram de 8 toneladas de pluma para a VEJA e 1 tonelada para a Anormal.
O cultivo do algodão na região da Borborema é histórico, com grande crescimento em meados do século XX e declínio na década de 1980, com a chegada da praga do bicudo. A retomada da produção no Polo da Borborema, em 2020, se deu de forma agroecológica. De lá para cá, o cultivo do algodão se mostra uma maravilhosa escolha quando o assunto é resiliência no Semiárido brasileiro diante das mudanças climáticas.
“Se a gente ficar esperando pelo cultivo do milho e do feijão e outros cultivos, muitas vezes não dá certo. Porque existem os comerciantes atravessadores, existem os anos em que a chuva é pouca e aí o preço é desmantelado. Com essa vinda do algodão, aquelas primeiras chuvas em que a terra está bem molhada, a gente aproveitando e plantando, o algodão se adapta bem aqui na nossa região que é muito seca”, explica o agricultor João Batista da Silva, do Sítio Capeba (Esperança-PB).
Fora a compra, uma boa nova que vai fortalecer a produção e comercialização é o processo de experimentação de controle biológico de pragas, que será realizado por quatro dessas famílias em seus cultivos consorciados, com acompanhamento da CoopBorborema, da AS-PTA e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). “Quando a gente faz um controle biológico bem feito, um determinado tipo de cultivo, nós temos um sistema mais equilibrado”, assegura Emanoel Dias, da coordenação colegiada da AS-PTA na Paraíba.
O tema da experimentação foi tratado durante o Seminário Territorial do Algodão Agroecológico, no mês de março deste ano, em Lagoa Seca (PB). Foto: AS-PTA
“A gente tem visto que quando os agricultores vêm conhecer as populações de pluma, das pragas, as doenças que sempre atacam naquele roçado, eles têm uma melhor condição de usar um produto natural como uma forma de prevenção ou de controle. A articulação da pesquisa com as famílias agricultoras é fundamental para que elas tenham consciência desses princípios agroecológicos”, acrescenta Emanoel. A escolha das famílias participantes está sendo feita coletivamente nos territórios.
Para Fábio Aquino, pesquisador da Embrapa Algodão que esteve presente no Seminário Territorial do Algodão Agroecológico, a “consciência organizacional elevada” da produção do Polo da Borborema é um diferencial. “O que tem chamado mais atenção na produção de algodão agroecológico do Polo da Borborema é capacidade organizacional das famílias agricultoras, que tem a intenção de fazer uma produção pensada em melhorias e um sentimento coletivo de ganhos para elas e seus entornos. Não só ganhos financeiros”.
O processo de experimentação vem para fortalecer essa característica. “É uma técnica bastante eficaz que, dentro dos sistemas agroecológicos ou orgânicos, desempenham um papel muito importante. Tanto o que depende de intervenção humana como o controle biológico natural apenas por ter um sistema menos agressivo ao meio ambiente, mais diversificado e que favorece a presença dessas defesas naturais, que fazem um trabalho gratuito para a gente”, reforça Aquino.
Comitiva de cerca de 30 pessoas da empresa francesa Veja/Vert percorreu municípios da região da Borborema para conhecer o processo de cultivo da fibra, em 2022. Foto: AS-PTA
Comércio justo
Tanto a capacidade de resiliência climática do cultivo do algodão agroecológico na Borborema (PB) quanto os processos de experimentação e organização das famílias agricultoras implicam nas vendas quando o assunto é comercialização justa. No mercado do algodão, assim como em outros mercados, há empresas que priorizam o lucro em detrimento da qualidade das plumas e do modo de trabalho envolvido nos cultivos.
No caso da venda do algodão agroecológico no território da Borborema, a situação é diferente. A empresa VEJA, principal compradora, tem pago um valor acima do mercado pela pluma, realiza sistemas de bonificação para agricultores que fazem todo o processo de certificação participativa e também a cooperativa, para apoiar o processo de mobilização e articulação das famílias agricultoras.
Essa boa relação comercial é garantida, acima de tudo, pelo cooperativismo que baseia a organicidade da agricultura na região da Borborema. O algodão não é um cultivo que se leva até a feira para vender, sua venda depende de um comércio específico e a CoopBorborema tem exercido um papel importante de diálogo entre as famílias agricultoras e as empresas têxteis.
“A cooperativa tem sido um espaço de buscar compradores para esse algodão das famílias da agricultura. É muito importante quando você já tem um mercado, você plantar e já ter garantido uma empresa que vai comprar”, pontua Márcia Araújo dos Santos, que é agricultora do Sítio Imbaúba, localizado no município de Lagoa Seca (PB) e presidenta da CoopBorborema.
Segundo ela, nos últimos três anos a produção do algodão agroecológico vem aumentando na região. “As famílias estão bem satisfeitas com esse plantio. Fui a uma reunião no município de Algodão de Jandaíra, onde só havia duas pessoas que estavam produzindo. Mas, este ano, a tendência é que aumente mais quatro agricultores. Então, para o nosso território, acredito que seja bem viável o cultivo do algodão para a renda das famílias agricultoras”.