O potencial de incidência política do Fórum Territorial da Borborema tem crescido junto à sua reestruturação. Com evidente participação dos poderes públicos municipais e diversos atores territoriais, isso ficou ainda mais evidente durante seu último encontro ocorrido no início de maio, em São Sebastião de Lagoa de Roça (PB). Agricultores e agricultoras, sindicatos, gestores públicos e organizações ligadas à agricultura familiar, agroecologia, pesquisa e ao cooperativismo se reuniram para uma tarefa fundamental: a construção de estratégias que valorizem a produção local de alimentos saudáveis e amplie o acesso da agricultura familiar às políticas públicas.
A metodologia do encontro se baseou no mapeamento da produção e comercialização de alimentos saudáveis, experiência semelhante a que a Rede ATER Nordeste de Agroecologia tem realizado no contexto do projeto Cultivando Futuros. O mapa traçado durante a plenária reafirmou a diversidade de culturas presente no território, trazendo desde cultivos tradicionais como o milho, feijão e macaxeira até os produtos beneficiados como doces, polpas e farinhas. Essa produção tem sido comercializada através de diversos canais – feiras agroecológicas e feiras livres, quitandas, porta-a-porta e programas institucionais como o PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar) e o PAA (Programa de Aquisição de Alimentos).
A presidenta do Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (STTR) do município de Queimadas e integrante do Polo da Borborema, Anunciada Moraes, observou a necessidade de fortalecer a participação da agricultura familiar local no mercado institucional. “Nós estamos localizados em um território que tem grande produção de alimentos agroecológicos. A gente viu isso na plenária, fazendo o exercício de mapear o que se produz, mas percebemos que ainda temos muitos agricultores que não têm procurado comercializar esses produtos a partir das compras institucionais”. “Os municípios têm a obrigação de comprar no mínimo 30% da agricultura familiar, mas pode chegar até 100%. Quer dizer, o limite não é 30%. A gente precisa se organizar para intervir na disputa do mercado, na comercialização dos nossos produtos na região”, acrescenta Nelson Anacleto Pereira, sindicalista de Lagoa Seca e integrante do Polo da Borborema.
Foto: Helena Dias/AS-PTA
Luciano Silveira, da coordenação da AS-PTA, pontuou a possibilidade de aumentar também a presença nas feiras livres. “A feira de Esperança, por exemplo, como ela está? Continua vigorosa? Podemos pensar em políticas que também favoreçam os mercados públicos e as feiras livres como espaço de venda direta. Isso é uma discussão que a gente deve fazer”. Já Fabiana Alvarenga, liderança sindical no município de Lagoa Seca, viu na plenária a possibilidade de ampliar o debate sobre fortalecimento das feiras agroecológicas. “Quando a gente vai fazendo a avaliação dos mercados territoriais, vai percebendo que tem as feiras livres, as quitandas e o porta-a-porta. A gente está aquém de outros mercados que existem, por isso é importante esse momento da plenária para a gente buscar soluções de fortalecimento das feiras agroecológicas”, afirmou.
Sindicatos, associações e cooperativas locais, assim como a Cáritas, a CONAB (Companhia Brasileira de Abastecimento), a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e o MST participaram da plenária. Vitória Vitor, da EMPAER (Empresa Paraibana de Pesquisa, Extensão Rural e Regularização Fundiária), destacou o papel das cooperativas no território. “Uma das coisas que eu vejo que fortalece é a consciência das pessoas trabalharem em conjunto, através das associações e das cooperativas. Associações e cooperativas sérias, onde a gente tem pessoas que estão indo para a cooperativa, sabendo que ela é dona desse empreendimento, o cooperado é um dos donos, é ele que decide junto com todos a posição, o sucesso ou o insucesso da cooperativa”.
A partir da plenária, o fórum já conseguiu articular uma audiência pública sobre o Garantia Safra, no município de Esperança, que está marcada para o início de junho deste ano. Também tem feito diálogos com secretários de agricultura dos municípios da região e está com uma formação do Programa de Formação em Compras Públicas para o mesmo mês.
Papel do poder público
Foto: Helena Dias/AS-PTA
“A gente entende que um plano estratégico para o território é para avançar nas políticas públicas e institucionais, em parceria com a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) e outras organizações”, destaca Fabiana Alvarenga sobre o momento de reestruturação do fórum. Entre os desafios mapeados na plenária, estão o aumento da concorrência da venda dos produtos agricultura familiar com os supermercados e produtos ultraprocessados, a dificuldade de certificar suas produções agroecológicas, os impactos das mudanças climáticas e a necessidade de ampliação da assessoria técnica.
São temas que atravessam as políticas públicas a nível nacional, mas o apoio das gestões municipais é indispensável, como na questão da garantia do Selo de Inspeção Municipal (SIM) nos municípios, um entrave para a agricultura familiar acessar políticas públicas que foi muito citado durante a plenária.
Perguntado sobre o papel da gestão municipal na resolução de problemas como este, Robson Pereira de Oliveira, secretário de Agricultura, Abastecimento e Meio Ambiente do município de São Sebastião de Lagoa de Roça, afirma que vê como uma tarefa “importante”, já que a população no seu município é majoritariamente rural. O aceno de compromisso do secretário foi direcionado, principalmente, para a juventude.
“Estamos em um processo de sucessão, as pessoas estão se aposentando. Estão vindo a maioria morar na cidade por uma questão de violência no campo e nós queremos trazer políticas públicas, trazer atrativos para que a juventude continue trabalhando na agricultura familiar e dessa forma garantindo a segurança alimentar do nosso povo”, explica. As estratégias propostas na plenária como um todo dialogam também com o tema da juventude. Outro ponto central é o enfrentamento à crise climática com a adoção de práticas agroecológicas mais resilientes.