Esta cartilha é resultado de um ano de trabalho coletivo e profundamente transformador desenvolvido com mulheres agricultoras familiares de 03 municípios do Paraná: Palmeira, Rio Azul e Teixeira Soares. O Projeto Quintal-semente: mulheres, autonomia e produção foi executado por meio da parceria institucional entre a AS-PTA – Agricultura Familiar e Agroecologia, o Grupo de Trabalho de Mulheres da Articulação Nacional de Agroecologia (GT Mulheres da ANA) e o Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata (CTA-ZM). A iniciativa teve como objetivo central promover processos de auto-organização e fortalecimento de redes de mulheres, com foco na autonomia, soberania e segurança alimentar e nutricional, geração de renda e conservação da sociobiodiversidade. Nesse caminho, os saberes das mulheres, materializados em seus quintais, suas práticas de produção e reprodução e sua relação com a terra foram nossa bússola.
Os resultados e reflexões apresentados nesta publicação foram alcançados por meio da metodologia político-pedagógica da Caderneta Agroecológica, desenvolvida com o objetivo de tornar visível os trabalhos produtivos e reprodutivos realizados pelas agricultoras familiares. A metodologia as convida a registrar, com base em suas próprias experiências e conhecimentos, tudo aquilo que é produzido, trocado, consumido, doado ou vendido a partir dos seus quintais e áreas de cultivo e de protagonismo. Trata-se de um processo de auto-observação, reconhecimento e valorização do fazer cotidiano, que fortalece a autonomia das mulheres, amplia sua compreensão sobre seu trabalho e potencializa processos coletivos de auto-organização e incidência política. As Cadernetas Agroecológicas contribuem, portanto, para a emancipação e a transformação social a partir da realidade das mulheres. Nessa metodologia, de cunho feminista, as agricultoras familiares – do campo, das florestas e das águas – são protagonistas de toda a pesquisa: refletem e produzem questionamentos e análises que qualificam e orientam a pesquisa; por essa razão, assumem a identidade de agricultoras-pesquisadoras.
Ao longo do projeto, as Cadernetas Agroecológicas foram adotadas como um meio de registro e reflexão sobre as práticas produtivas cotidianas das agricultoras-pesquisadoras. Muito além de um simples método de anotação, as cadernetas assumiram um caráter político fundamental: tornaram-se uma ferramenta de visibilidade do trabalho realizado por essas mulheres, contribuindo para o reconhecimento de sua importância na manutenção da socioagrobiodiversidade, na geração de renda, na garantia da soberania e segurança alimentar e nutricional, no fortalecimento dos tecidos sociais dos territórios e comunidades – são elas as cuidadoras da vida – e na construção de uma vida livre de violências. Elas também se revelaram uma potente base para a formulação de políticas públicas voltadas à agricultura familiar, às mulheres do campo e à agroecologia.
No contexto do território, muitas mulheres ainda enfrentam o desafio de estarem vinculadas à cultura do fumo, marcada pela lógica da monocultura e pela dependência de insumos externos. No entanto, também emergem as experiências que essas mulheres vêm construindo coletivamente: ações concretas de transição, diversificação e fortalecimento da agroecologia. Também se destaca a contribuição da AS-PTA, através de seu Programa Local Paraná, que atua no território desde os anos 2000, animando processos de organização de redes e de sujeitos coletivos em defesa da agroecologia, como os grupos e coletivos de mulheres agricultoras familiares e juventudes.
Esta cartilha é, portanto, resultado de um processo coletivo e transformador. O material apresenta os dados levantados ao longo de todo o período de execução do projeto – entre novembro de 2023 e outubro de 2024 – e reflexões sobre a importância do trabalho das mulheres e os desafios que ainda marcam suas vidas, como podemos verificar com os dados sistematizados.
Cada registro é expressão de um fazer cotidiano que resiste, transforma e propõe novos caminhos. Que esta publicação contribua para ampliar o reconhecimento das agricultoras como protagonistas da agroecologia, para fortalecer processos de auto-organização e projetos políticos e institucionais, além de ações e redes comprometidas com a justiça social. Sem feminismo, não há agroecologia!
Clique e baixe: A caderneta agroecológica e o projeto Quintal-semente: mulheres, autonomia e produção