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POR UM BRASIL LIVRE DE TRANSGÊNICOS
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Número 293 – 24 de março de 2006
Car@s Amig@s,
Apesar do fatalismo apregoado pelos proponentes da transgenia, a intensidade das manifestações anti-transgênicos vistas na semana passada em Curitiba deixou mais do que evidente que não há nada decidido nesse jogo. Por ocasião da realização do Terceiro Encontro das Partes do Protocolo de Cartagena de Biossegurança (MOP 3) e do Fórum Global da Sociedade Civil (paralelo à MOP) o debate sobre os transgênicos voltou ao grande noticiário com muita força.
O lobby pró-transgênico continua a insistir em frases de efeito como “os transgênicos já são uma realidade” ou “esta tecnologia veio para ficar”, procurando manter a sociedade num estado de conformismo frente a produtos de segurança cada vez mais duvidosa e desenvolvidos para aumentar o controle de poucas empresas sobre a produção agrícola.
A situação de conformidade que se busca criar também procura fazer crer que os produtos transgênicos são equivalentes aos convencionais e que medidas de controle ou identificação desses produtos são desnecessárias e redundantes. Felizmente, não é assim que a coisa vem acontecendo, tanto é que na semana passada diferentes veículos de comunicação se esforçaram para explicar a seu público a diferença entre “contém” e “pode conter transgênicos”, mostrando que esta não é uma discussão marginal com sentido apenas para entendidos do assunto.
Durante uma semana, representantes de 132 países se reuniram em Curitiba para discutir as formas de implementação de medidas de biossegurança associadas ao transporte internacional e uso de organismos vivos modificados (OVMs). O principal debate, que tratou da identificação de cargas com OVMs, beirou o impasse mas acabou chegando a um resultado que ao menos impediu o naufrágio do Protocolo.
Negociada a partir da proposta e da liderança brasileira, a identificação de cargas deverá informar que um carregamento “contém” transgênicos nos casos em que a cadeia de produção provê essa informação e “pode conter” nos casos em que não se tem conhecimento do conteúdo da carga. Na MOP 5, ou seja, daqui a 4 anos, os países signatários do Protocolo deverão avaliar essa medida com vistas a tomar uma decisão pelo “contém” dali a dois anos, na MOP 6. Assim, se conquistou mais seis anos de portas abertas para a contaminação por transgênicos e de dificuldades para os que preferem manter seus sistemas de produção sem essas sementes.
Durante a primeira semana do Fórum Global da Sociedade Civil foram realizados 9 painéis, todos críticos aos transgênicos, com a participação de 25 palestrantes de 11 países, além de uma feira da biodiversidade, manifestações diárias de centenas de militantes da Vía Campesina e um ato em defesa do milho crioulo organizado por agricultores familiares do Sul do País. Neste ato foi lida e aprovada uma carta à CTNBio expressando as preocupações dos produtores familiares ecológicos em relação aos pedidos de liberação comercial de milho transgênico que constam da agenda da Comissão.
Já na reunião oficial, ficou evidente que as discussões sobre o Protocolo de Cartagena só não atingiram propostas mais avançadas de controle do uso dos transgênicos porque a vontade de países e de suas populações esbarram e são limitadas pelo poder político-econômico de um reduzido grupo de multinacionais da área de sementes, agroquímicos e fármacos. Essa força decisória do mundo globalizado expressou sua vontade através de alguns governos vinculados aos Estados Unidos, como Paraguai e Nicarágua, mas principalmente México, e também na grande quantidade de lobistas presentes nas delegações de diferentes países. No caso brasileiro, de uma delegação oficial de 136 pessoas, 67 eram do governo e 69 observadores. Entre estes, mais de 30 eram das indústrias e apenas 6 de ONGs e movimentos sociais. Interessante destacar o apego desses setores pró-transgênicos à falta de transparência: além de boicotarem a rotulagem interna de alimentos e defenderem a identificação vaga de transgênicos no mercado internacional, não se apresentaram na reunião de Curitiba como representante de indústrias, mas sim como “ONGs” ou “Parties” (Parte do Protocolo, o mesmo status de membros do governo).
Fica, assim, mantida a questão: se os transgênicos apresentam tantas vantagens, por que não identificá-los claramente e por que seus proponentes não se apresentam publicamente como o que de fato são?
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Convenção da Diversidade Biológica mantém moratória global às sementes terminator.
Na COP 8, Austrália, Canadá e Nova Zelândia, juntos com os Estados Unidos (que não são parte da Convenção) e empresas de biotecnologia, estavam pressionando para que fossem liberadas pesquisas de campo com as sementes transgênicas estéreis baseadas em “avaliações caso a caso”. Esta proposta foi rejeitada hoje por unanimidade no grupo de trabalho que discute o tema, mas ainda depende de aprovação pelo plenário da Conferência das Partes da Convenção da Diversidade Biológica.
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Neste número:
1. Transgênico só será identificado depois de 2012, conclui encontro
2. Itamaraty destaca atuação na MOP 3
3. Agora é oficial: Brasil é contra os GURTs
4. Terminator sofre derrota na Câmara
5. Paraná tem regulamentação para rotulagem
6. Rotulagem rígida na “terra da resistência aos transgênicos”
7. Syngenta ganha multa do Ibama por experimentos
8. Ainda em meio a polêmicas, CTNBio quer mais agilidade
9. Protocolo de Cartagena gera disputa no Congresso
Sistemas agroecológicos mostram que transgênicos não são solução para a agricultura
A experiência da família de dona Maria e seu Edísio – Estoque familiar: conservação e armazenamento de sementes
Dica sobre fonte de informação
Um “blog” administrado por jovens norte-americanos que participaram do MOP 3, trazendo notícias, entrevistas e campanhas para um mundo livre de transgênicos.
www.wheredidmygenesgo.org
Confira fotos da MOP 3 e da COP 8 noftp://ftp.imk.com.br/cop8
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1. Transgênico só será identificado depois de 2012, conclui encontro
Os países-signatários do Protocolo de Cartagena sobre biossegurança decidiram estender para 2012 o prazo de transição para a identificação clara de substância transgênica em cargas destinadas à exportação. A redação final abre possibilidade para revisão dessa regra, caso a experiência de alguns países demonstre que a identificação é inviável.
Aprovada em plenário, essa decisão fechou na noite de sexta-feira a MOP-3 (3ª Reunião das Partes) do protocolo. O afrouxamento do prazo protela a adoção de regras rígidas para movimento de cargas transfronteiriças, incluindo as realizadas com países não-signatários, como os EUA. Nenhum dos participantes, porém, admitiu fracasso das negociações.
O texto do governo do Brasil que orientou o debate propunha limite de quatro anos para adaptação da informação. Ele defendia a progressiva adoção do termo “contém” OVM (organismo vivo modificado) até 2010.
A dilação foi resultado da pressão do México. Parceiro dos EUA e do Canadá no Nafta (Acordo de Livre Comércio da América do Norte), o país conseguiu abrandar, no texto final, a tentativa da maioria de exigir que países não-signatários do acordo seguissem as mesmas regras nas transações bilaterais. O documento só vai “convidar” os não-signatários a adotar as regras do protocolo -o texto inicial propunha “exortar”.
A ministra Marina Silva (Meio Ambiente) fechou a reunião dizendo lamentar que a posição da maioria dos 132 membros do protocolo não tenha sido seguida.
A socióloga Marijane Lisboa, da Associação de Agricultura Orgânica, disse que os negociadores “fizeram tudo o que o México quis”. O diretor de políticas públicas do Greenpeace, Sérgio Leitão, chamou de “chocho” o texto final.
Mesmo com a prorrogação do prazo, o governo brasileiro pretende abrir já linhas de crédito especiais para estimular produtores e exportadores a fazer a identificação clara do produto transgênico.
Agência Folha, 21/03/2006.
2. Itamaraty destaca atuação na MOP-3
O Itamaraty avaliou como um marco histórico a posição defendida pelo Brasil durante a 3ª Reunião das Partes do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança (MOP-3), em Curitiba. Segundo nota divulgada no sábado, o Itamaraty alega que o Brasil inovou ao propor um processo para superar as divergências quanto à identificação da presença de transgênicos nas cargas de grãos entre países. Nos próximos quatro anos, será utilizada a expressão “contém OVM”, seguida do nome do Organismo Vivo Modificado presente. Se tal identificação não for possível, será empregada “pode conter OVM”, seguida de uma lista de prováveis compostos. Na reunião do MOP em 2010, os países avaliarão a sugestão brasileira. Uma posição definitiva sairá em 2012.
Correio do Povo, 20/03/2006.
3. Agora é oficial: Brasil é contra os Gurts
País vai defender na COP8 manutenção da decisão tomada na COP5 que prevê a moratória sobre testes e comercialização com esses organismos
Após uma reunião na tarde de hoje, a delegação brasileira decidiu manter a posição que vinha adotando em outras conferências globais quanto ao uso das chamadas Técnicas de Restrição de Uso Genético (Gurts), que produzem as sementes estéreis chamadas por organizações não governamentais de Terminator (Exterminador).
O Brasil acredita que a tecnologia ainda representa um risco para o meio ambiente e à saúde, e defende que os testes devem ficar restritos aos laboratórios.
Essa posição brasileira dilui, ao menos na teoria, divergências entre o Ministério do Meio Ambiente e os ministérios da Agricultura e da Ciência e Tecnologia. De acordo com o chefe do Departamento de Temas Especiais do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, Luiz Alberto Figueiredo Machado, a delegação nacional julgou que o texto proposto em Granada, poderia levar a “dúvidas de interpretação”.
Na reunião na Espanha, realizada em janeiro, o governo australiano, tradicional aliado dos Estados Unidos, atacou a moratória e propôs uma análise caso-a-caso para a liberação de testes de campo das sementes Terminator.
Conforme Figueiredo, a posição nacional deve ser bem recebida por países da África, além da Índia e Malásia, e enfrentar resistência de países do chamado Juscanz, grupo que envolve Japão, Estados Unidos, Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Suíça, Noruega, México e Islândia. “Não pretendemos mudar de posição”, disse o diplomata.
De acordo com organizações não-governamentais ligadas à uma campanha global pelo fim das sementes Terminator, esses grãos estéreis quebrariam a tradição de melhoramento genético de sementes que a humanidade desenvolve há cerca de 10 mil anos, desde a criação da agricultura. No Brasil, onde 75% da produção de alimentos que acabam no mercado interno são oriundos da agricultura familiar, os impactos dos Gurts seriam previsíveis.
“Os Gurts podem prejudicar comunidades locais e comprometer fortemente espécies silvestres, como de milho e de arroz”, ressaltou Lídio Coradin, gerente de Recursos Genéticos do Ministério do Meio Ambiente. “Essa tecnologia merece ainda cuidados especiais”, completou.
MMA Portal COP-8, 21/03/2006.
http://www.cdb.gov.br/news_listing
Confira nota do Ministérios das relações Exteriores no http://www.cdb.gov.br/Members/carlost/nota-do-ministerio-das-relacoes-exteriores-sobre-as-gurts
4. Terminator sofre derrota na Câmara
Projeto de lei que autoriza a utilização de sementes estéreis é rejeitado na Comissão de Meio Ambiente
A indústria da biotecnologia sofreu uma derrota no Congresso Nacional. Isto porque a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara rejeitou, na terça-feira (21), o projeto de lei 5964/05, apresentado pela deputada Kátia Abreu (PFL-TO) em 28 de setembro de 2005, que autoriza a utilização de tecnologia genética de restrição de uso no plantio de transgênicos. Ou seja, o uso das sementes estéreis Terminator. Os ambientalistas comemoraram a vitória pelos corredores do Expo Trade, em Pinhais, na Grande Curitiba, onde acontece a 8ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP8).
A rejeição ao PL representa uma derrota para a indústria da biotecnologia que defende o uso de sementes Terminator. A proposta da deputada Kátia Abreu também retira da Lei de Biossegurança as penas previstas em caso de uso dessa tecnologia (pena de reclusão de dois a cinco anos e multa).
O parecer pela rejeição foi apresentado pelo deputado João Alfredo (PSOL-CE) para frustração da pefelista e do relator do projeto, deputado Oliveira Filho (PL-PR). A proposta segue agora para as comissões de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural; e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Depois, vai para o Plenário da Câmara dos Deputados.
MMA Portal COP-8, 23/03/2006.
http://www.cdb.gov.br/Members/carlost/terminator-sofre-derrota-na-camara
5. Paraná tem regulamentação para rotulagem
O governador Roberto Requião assinou ontem, no centro de convenções onde acontece a reunião da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre biodiversidade, o primeiro decreto estadual que regulamenta a lei de rotulagem de produtos geneticamente modificados. É mais uma medida contra o mercado de transgênicos — o estado já proíbe o ingresso de transgênicos no Porto de Paranaguá, e mantém como “não recomendável” o plantio de grãos geneticamente modificados no estado.
A medida do governo paranaense atingirá toda a cadeia produtiva, até o varejo, a partir da exigência de informações claras sobre substâncias transgênicas nas embalagens de produtos de alimentação humana ou animal.
DCI, 23/03/2006.
6. Rotulagem rígida na “terra da resistência aos transgênicos”
Em outdoors espalhados por Curitiba, o governo do Paraná recebeu os participantes da 8ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica, organizada pela Organização das Nações Unidas (ONU), com a seguinte frase, escrita em português e inglês: “Bem-vindo à terra da resistência aos transgênicos”.
Ontem, no evento, o governador Roberto Requião (PMDB) pôs a informação em prática e prometeu, por decreto, retirar dos supermercados do Estado os produtos que contenham organismos geneticamente modificados (OGMs) ou tenham sido feitos a partir de grãos transgênicos e não tragam no rótulo essas informações. A regra vale para a indústria local e de fora e também para espécies animais que tenham sido alimentadas com ração que contenha esses ingredientes na composição.
“Os liberais dizem que as cooperativas e as grandes corporações têm direito de escolher o que plantam, mas querem negar ao consumidor o direito de saber o que compram e o que comem”, disse o governador. Requião também assinou um decreto com restrições ambientais para as licitações do Paraná e proibiu a aquisição, pelo Estado, de alimentos transgênicos.
O decreto sobre rotulagem cita o Código de Defesa do Consumidor e exige que, nas embalagens, junto com triângulo amarelo com o “T” que identifica os transgênicos, a indústria coloque o nome do ingrediente modificado. O mesmo deve ser feito em produtos comercializados a granel ou in natura, como carnes. Nesse caso, a informação deve constar nos painéis colocados nos pontos-de-venda.
O documento dá direito aos fabricantes de identificar os itens livres de transgênicos, mas proíbe a venda dos que possuam “denúncia fundamentada” de presença de OGMs e estejam sem o rótulo exigido. A denúncia será apurada e, caso comprovada, os produtos serão destruídos e o fabricante punido com advertência, multa e até suspensão da atividade. A fiscalização será das secretarias da Agricultura e da Saúde e do Procon.
As informações do rótulo também devem ser colocadas na nota fiscal. No artigo 7 consta que “o ônus da prova recai sobre o fornecedor”. Diferentemente da lei federal, que exige rotulagem quando o produto tenha mais de 1% de transgenia, a lei paranaense não prevê porcentagens. “Não temos tolerância alguma”, disse Requião.
A medida foi elogiada por membros do governo federal, como a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e por movimentos sociais e ONGs como Greenpeace e Consumers International – que representa consumidores de 113 países e vai divulgar globalmente a medida para que os governos privilegiem a soja paranaense.
A Abiove, que representa a indústria brasileira de óleos, divulgou nota em que afirma que, mesmo com o uso de soja modificada, o produto chega ao consumidor com menos de 0,1% de transgenia. “No caso do óleo de soja, não há o que rotular”, pontua a nota.
O deputado Eduardo Sciarra (PFL) afirmou que seu partido, que entrou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra a decisão do Paraná, pediu para que o Supremo apresse o julgamento do caso, que vai contra a lei federal. Ele lembrou que o mesmo já havia acontecido em 2003, quando Requião proibiu o plantio, transporte e comercialização de transgênicos no Estado, “mas perdeu na Justiça”.
Valor Online, 23/03/2006.
7. Syngenta ganha multa do Ibama por experimentos
O Ibama multou ontem em R$ 1 milhão a multinacional Syngenta Seeds, devido aos experimentos com produtos transgênicos em Santa Tereza do Oeste (PR). A empresa tem 20 dias para recorrer. A lavoura de soja, de 12 hectares, havia sido embargada anteriormente. A área foi invadida por 800 integrantes da Via Campesina no dia 14. Eles permanecem no local, apesar de ontem ter vencido o prazo para a desocupação.
Correio do Povo, 22/03/2006.
8. Ainda em meio a polêmicas, CTNBio quer mais agilidade
Para Walter Colli, da CTNBio, o argumento científico deve sempre prevalecer. A primeira reunião deliberativa da nova Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) – realizada nos dias 22 e 23 e tendo à frente o médico bioquímico Walter Colli – foi marcada por um novo embate entre as alas ambientalista e pró-biotecnologia. O motivo foi a decisão sobre a necessidade de tornar obrigatório que as empresas enviem comunicados sobre contaminações acidentais por organismos geneticamente modificados em áreas de pesquisa.
Os ambientalistas queriam aproveitar a revisão de normas internas para tornar obrigatório o comunicado ao Ministério Público. Após intensas discussões, venceu a tese de restringir o comunicado aos três órgãos de fiscalização – Secretaria de Defesa Agropecuária, Ibama e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Mas, ainda que a primeira decisão tenha sido tomada sob polêmica, a retomada das operações da CTNBio é vista com ânimo pelo setor privado, que enfrenta oposição do governo paranaense aos transgênicos.
Em entrevista por e-mail ao Valor, Colli, novo presidente da (CTNBio), confirmou a intenção de dar mais agilidade às análises dos pedidos para aprovação de pesquisas e de uso comercial de produtos geneticamente modificados (OGMs). De acordo com ele, existem atualmente 539 pedidos para análise (sendo 11 os pedidos de liberação comercial de produtos). “Sou uma pessoa ansiosa e quero sempre resolver tudo o que está pendente. (…) No entanto, certos ritos terão que ser respeitados, observando-se procedimentos estritamente democráticos e em obediência aos diplomas legais que, aliás, não foram aprovados com a minha participação”, afirmou. Colli disse que a Comissão estuda estabelecer “filas” de processos conforme sua natureza, havendo filas para concessão ou extensão de Certificados de Biossegurança, liberação de OGMs no meio ambiente e liberação comercial. “A menos que apareça algo que seja de interesse imediato para a saúde humana ou animal, ou uma agressão iminente ao meio ambiente, o critério mais justo é a fila. (…)
Acho que essas filas devem caminhar em paralelo, mas é a maioria da Comissão que vai decidir”. Ele afirmou ter consciência da heterogeneidade da Comissão e espera que as decisões sejam pautadas pelo conteúdo científico. “Espera-se que sempre prevaleça o argumento alicerçado na literatura científica conhecida, bem como no que de mais moderno as pesquisas científicas indicarem, nos termos dispostos na Lei de Biossegurança e no Decreto que a regulamenta”. Em relação à lentidão na aprovação do decreto que regulamenta a Lei de Biossegurança, o médico bioquímico afirmou que é impossível quantificar os prejuízos que essa demora possa ter causado à evolução da pesquisa em biotecnologia no Brasil. “Imagino que pleitos de liberação planejada e controlada no meio ambiente de OGMs tenham sofrido atraso de, pelo menos, um ano”, pontuou.
Questionado sobre a legislação atual, Colli afirmou que não vê necessidade de mudanças. “Não há porque modificá-los: temos que aplicá-los diligentemente. Poderia ser mais simples e rápido? Poderia. Mas, é possível que, em nome da rapidez, estaríamos ferindo interesses e crenças de posições diversas”. Para ele, só com tempo será possível avaliar a necessidade de mudanças na legislação.
Colli demonstrou serenidade em relação às notícias de que sua escolha como presidente da Comissão é vista com resistência por parte de alguns representantes de ministérios. O dirigente observou que ele foi indicado como especialista na área de saúde humana pelo Ministério da Saúde. E entre indicações feitas por mais de 90 instituições da sociedade civil, ele foi a pessoa mais votada, com quatro indicações (os demais tiveram no máximo três indicações). “Dos 27 membros havia 23 no momento da eleição. Eu tive 15 votos, um a mais que a maioria absoluta. Coerentemente, o Ministro me escolheu, assim como nomeou Vice-Presidente o Professor Horácio Schneider que teve 13 votos. Que eu saiba não houve irregularidade, apenas cumprimento da lei e obediência à maioria de votos”. Sobre a possibilidade de enfrentar resistência desses membros nos debates durante as próximas reuniões da CTNBio, Colli foi enfático: “Quanto à avaliação sobre as “forças de oposição” digo que isso não deveria haver em uma Comissão Técnica, mas se houver, fazer o quê?”, afirmou.
Colli disse ainda que vê como “uma conseqüência do espírito monárquico-absolutista arraigado em todo brasileiro” a objeção à sua eleição como presidente da CTNBio. “(…) o Presidente manda no Brasil, o reitor na universidade e, portanto, o presidente da CTNBio deve mandar nela. Isso não é verdade em nenhum dos casos citados nem na CTNBio que é constituída por 27 especialistas, muitos com conhecimento superior ao meu em assuntos específicos, que votam com independência, cada membro se manifestando de forma nominal e motivando o voto. A mim resta ouvir os especialistas atentamente para poder exercer de forma consciente o meu direito a um voto que é apenas 1/27 do colegiado”. (Colaborou Mauro Zanatta, de Brasília)
Contexto
A CTNBio coloca a partir desta sexta-feira (dia 24) em consulta pública a proposta de Instrução Normativa nº 1, que trata da emissão do Certificado de Qualidade em Biossegurança (CQB), documento exigido para realização de pesquisas de biotecnologia em laboratórios. O texto ficará sob consulta pública por um período de 15 dias para envio de sugestões pela sociedade. As propostas deverão ser analisadas na próxima reunião da CTNBio, marcada para os dias 18 e 19 do mês de abril. Na próxima reunião também serão analisados projetos de pesquisa e plantio de transgênicos que atualmente ainda aguardam avaliação da comissão.
Valor Econômico, 24/03/2006.
10. Protocolo de Cartagena gera disputa no Congresso
A briga de bastidores desatada no governo pela identificação das cargas de organismos geneticamente modificados no trânsito internacional de mercadorias chegou ao Congresso Nacional.
A bancada ruralista da Câmara dos Deputados exigirá a ratificação pelo Congresso das modificações feitas no texto do Protocolo de Biossegurança de Cartagena durante reunião, realizada na semana passada, em Curitiba (PR). “Não abrimos mão disso.
O governo terá que explicar o porquê dessa decisão”, avisou o deputado Abelardo Lupion (PFL-PR), indicado novo presidente da Comissão de Agricultura. A principal mudança, apoiada por representantes de 132 países, prevê o uso da expressão “contém” para identificar um determinado tipo de transgênico a partir de 2012 nos documentos de trânsito. Até lá, continuará em vigor o termo “pode conter”. Antes disso, em 2010, uma nova reunião revisará a regra atual.
De olho nas potenciais travas comerciais suscitadas pelo “contém”, os ruralistas usam dois argumentos para exigir a ratificação: o decreto de promulgação do protocolo, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no último dia 17 de fevereiro, e a efusiva comemoração feita pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, depois da mudança da posição brasileira. De fato, o Decreto nº 5.705 estabelece que “são sujeitos à aprovação” do Congresso Nacional todos os atos que “possam resultar em revisão” do Protocolo de Cartagena ou que “acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional”.
Em conversas reservadas, o presidente Lula já admitiu a obrigatoriedade da ratificação pelo Congresso. O secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, entende, porém, não ter havido mudança “substantiva” para obrigar uma ratificação do acordo. “Não houve mudança substantiva importante. Temos defendido isso desde o início das discussões internas no governo”, afirma Capobianco. Segundo ele, o impacto da substituição de “pode conter” pelo “contém” só será sentido após a entrada em vigor do novo texto. “É coisa para o futuro”, diz. Apoiado nos bastidores pelo ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, o movimento pela ratificação ganhou força e já produziu uma nota oficial da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). “Entendemos que o Congresso é o fórum apropriado para discutir este assunto e, portanto, antes da manifestação oficial do Parlamento sobre a questão, medida alguma poderá ser adotada”.
De acordo com a CNA, o custo da mudança chegaria a R$ 1,5 bilhão por safra, ou um aumento de até 9% nos custos de produção. “Os produtores brasileiros acompanharão com atenção os debates no Congresso Nacional, durante os quais deverão ser ouvidos todos os segmentos diretamente envolvidos nesta questão”, afirma o texto.
Valor Econômico, 24/03/2006.
Sistemas agroecológicos mostram que transgênicos não são solução para a agricultura
A experiência da família de dona Maria e seu Edísio – Estoque familiar: conservação e armazenamento de sementes
Dona Maria e seu Edísio moram em Casserengue (PB), são casados e têm dois filhos. Seu Edísio era marchante e dona Maria sempre cuidou da lavoura – planta, colhe e armazena sementes selecionadas.
No início, a agricultora plantava em consórcio feijão, algodão mocó, fava, milho e alguns legumes. O casal vendia o algodão e a renda obtida ajudava no sustento da família. Aconselhados por uma empresa governamental de extensão, deixaram de plantar consorciado, pois com a monocultura aumentariam a produtividade. Nos anos seguintes, passaram a sofrer com o ataque de pragas, quedas na produção, degradação ambiental e diminuição da renda. Mesmo assim, seu Edísio conseguiu acumular recursos, trabalhando como marchante e vendendo algodão.
Dona Maria nunca deixou de guardar as melhores sementes – seleciona e armazena com bastante cuidado as mais produtivas, rentáveis e saborosas, utilizando-as nos anos seguintes. Separa suas sementes e as coloca para secar no sol, só tira quando estiverem bem secas e frias. Antes de armazenar, dona Maria mistura com as cinzas do fogão. Em seguida, guarda em garrafões e silos, mistura água com cinzas e faz uma “lama”, colocando na tampa dos recipientes. Quando a lama seca, se transforma em um torrão e veda os vasilhames com eficiência. Preserva há muitos anos os feijões macassa, cariri, camaupu, mulatinho da vagem roxa, carioca e o milho de 60 dias. Nunca perdeu sementes com gorgulho. Nas épocas de seca, as distribui para os filhos e vizinhos. Toinho de Edísio, filho de dona Maria, já viajou dentro e fora do país, divulgando com orgulho essas e outras experiências da família.
http://www.agroecologiaemrede.org.br/experiencias.php?experiencia=130
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Campanha Por um Brasil Livre de Transgênicos
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